Depressão

capa teseMinha tese de doutorado teve como tema central a depressão.

Fruto do meu contato com os pacientes depressivos na clínica, nas conversas particulares e de como a mídia em geral aborda esse tema, foi-se desenvolvendo na minha cabeça uma ideia de pesquisa acadêmica diferente do meu mestrado. Assim, o primeiro capítulo da minha tese teve como enfoque o caráter social da problemática depressiva, centralizando a característica hipermoderna e antidepressiva da sociedade como um fator mantenedor dos sintomas depressivos. Essas características também são sinalizadoras de um mal-estar, pois a experiência do luto, da perda, da depressividade, paradoxalmente necessária para o sujeito lidar com os sintomas depressivos, é rechaçada diante do imperativo ideal contemporâneo da eficácia e do consumo.

Contudo, as características da hipermodernidade não se constituem como resposta à origem dos sintomas dos sujeitos depressivos, elas somente evidenciam o lugar de sujeitos que estão inseridos em um mal-estar diferente da época vivida por Freud. Talvez por isso a minha tese tenha se iniciado a partir da interseção entre a depressão e os aspectos sociais no qual estamos inseridos, como se ela fosse se desenrolar em um maior desenvolvimento da relação entre hipermodernidade e depressão ao longo de toda tese. Entretanto, ela não segue esse caminho. E se ela fizesse isso, talvez ferisse o que há de mais singular na pesquisa em psicanálise. Afinal, apesar de ter sido necessário delimitar os objetivos e os resultados esperados da pesquisa de forma muito clara para sua submissão do projeto ao comitê de ética (ou seja, dizer aonde essa tese iria ou pretendia chegar), se ela, de fato, realizasse essa previsão, entendo que a pesquisa teria, provavelmente, falhado no seu propósito. Pois, como nos ensina Freud, Lacan, Laplanche e outros psicanalistas, quando se encontra o que se procura, no fundo não se acha nada novo. Teria utilizado as manifestações clínicas a serviço de testemunhar um conhecimento pré-estabelecido, perdendo de vista o essencial na pesquisa psicanalítica. Assim, no desenvolvimento da escrita da tese, a questão da hipermodernidade e a depressão passam a assumir um lugar de segundo plano para dar lugar ao questionamento de como é que o objeto se constitui psiquicamente e como o sujeito se relaciona com ele na depressão.

Dessa forma, a tese também me suscitou novos questionamentos sobre a pesquisa em psicanálise na universidade, pois o papel de pesquisador e analista não se alinham perfeitamente em relação a prazos, objetivos gerais, objetivos específicos e demandas éticas universitárias. O capítulo sobre a metodologia utilizada na tese teve esses questionamentos como tema central na sua elaboração: afinal, sou pesquisador ou analista?

Assim como no mestrado, os autores principais utilizados no desenvolvimento da tese foram Freud, Winnicott e Green. Porém, as contribuições de Pierre Fedidá, Melaine Klein e de autores brasileiros como Luis Cláudio Figueiredo e Maria Rita Kehl se mostraram importantíssimas para a elaboração do conceito de depressão e das particularidades de sua clínica. Especificamente, foram resgatados e desenvolvidos os conceitos de transferência (Freud); objeto suficientemente bom (Winnicott); holding (Winnicott); posição depressiva (Klein); trabalho do negativo (Green); Mãe Morta (Green); depressividade (Fedidá).

Seguindo esses autores, a tese sustenta que o sujeito depressivo busca preservar o impreservável por meio de uma demissão subjetiva. Sua problemática está relacionada em suas causas pela impossibilidade de perda do ideal do objeto que subsiste em negativo, preenchendo de forma positiva o lugar da falta e instaurando um vazio que é o oposto da ausência. Enquanto a ausência é uma categoria intermediária da experiência entre a presença e a perda que coloca o sujeito em movimento, o vazio impõe a imobilidade afetiva e representacional. A impossibilidade da perda do objeto perdido (mas nunca efetivamente perdido) impede esses sujeitos de se colocarem no movimento e na transformação necessários à vivência do novo.

Respaldando essa tese e buscando demonstrar formas de acessar a negatividade no processo analítico, considerando o estatuto metapsicológico do objeto, foram atendidas seis pessoas inseridas dentro da problemática da depressão. Estes fizeram o tratamento clínico psicanalítico (análise) no Centro de Atendimento e Estudos Psicológicos (CAEP) da Universidade de Brasília e em consultório particular. A partir desses atendimentos, foram realizados quatro estudos de caso, que demonstraram o lugar da análise na função de remediar as falhas do objeto não somente pela fala do paciente, mas essencialmente pela escuta do analista que, em sua dimensão temporal, sinaliza o tempo da ausência. O enquadre, como mantenedor de uma função de holding, e o divã, como lugar do objeto que falta, são também aliados nesse processo. Dessa forma, a análise pode ser um dispositivo construído para reativar e favorecer os processos de luto; retomar a elaboração das posições esquizo-paranoide e depressiva; vivenciar a depressividade; e, finalmente, desenvolver, no analisando, uma confiança madura nas suas relações objetais.

Confira a tese na íntegra:

http://repositorio.unb.br/handle/10482/34347

Link para download em pdf:

http://repositorio.unb.br/bitstream/10482/34347/1/2018_Greg%c3%b3riodeSordiGreg%c3%b3rio.pdf

 

Gregório De Sordi

Psicólogo, CRP 01/16979, mestre e doutor em Psicologia Clínica e Cultura pela Universidade de Brasília. Foi professor e coordenador do curso de psicologia da UNICEPLAC. É editor associado da revista "Psicologia: Teoria e Pesquisa" (Qualis A1). Tem experiência profissional na área de saúde mental, psicanálise, psicologia clínica e avaliação psicológica. Atende, com enfoque psicanalítico, adolescentes e adultos em consultório particular localizado em Brasília-DF e atendimentos virtuais. Telefone: (61) 999425123

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