Ritalina e o Déficit de atenção

Recentemente recebi uma carta da Associação Brasileira do Déficit de Atenção (ABDA) e da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) negando:

– O uso indiscriminado de Ritalina e os perigos deste medicamento (clique aqui para ler a bula da Ritalina);
– As crescentes críticas ao diagnóstico do Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade;
– As possíveis falhas nesta avaliação diagnóstica;

Vamos ver então alguns fatos:

venda de ritalina cresce

Fonte: Instituto Brasileiro de Defesa dos Usuários de Medicamentos.

vendas de ritalina sobem

 Em 1990, foram vendidos 16,4 mil caixas de Ritalina

– Em 2008, as vendas passaram a 1,15 milhão.

– Hoje estima-se que já ultrapasse os 2 milhões. (Quanto $$ será que isso rende? Que negócio bom!)

Mas Porque?

Encontramos hoje basicamente 3 formas de consumo da Ritalina:


1) Abuso e uso da droga como análoga a cocaina
2) Uso para melhorar o desempenho em provas
3) Uso controlado e prescrito para TDAH

1) Segundo pesquisa divulgada em 2000 pela Drug Enforcement Administration (DEA), pessoas que receberam Cocaína e Ritalina não conseguiram distinguir a diferença entre as duas. No mesmo estudo também foi administrado as mesmas substancias em animais e não foi possível diferenciar os efeitos em seus comportamentos. Isso não acontece por acaso, a Ritalina é quimicamente similar a Cocaina. Dessa forma, torna-se mais barato recorrer a Ritalina. A venda sem prescrição médica está tão facil que se você pesquisar no google, certamente achará diversas pessoas vendendo. ACEITAM ATÉ PAGAMENTO SEGURO PARCELADO NO CARTÃO DE CRÉDITO. É capaz de ter nota fiscal e nota legal. A crítica aqui certamente vai para a impunidade das leis Brasileiras.


2 e 3) Gosto da posição do neurocientista Steven Rose, publicada no livro “O Cérebro do Século XXI“:

“O peremptório Diagnostic and Statistic Manual, com base em dados dos Estados Unidos, agora inclui como categorias de doenças o transtorno opositor desafiante, o distúrbio do comportamento destrutivo e, mais notavelmente, uma doença chamada de distúrbio de hiperatividade e déficit de atenção, que supostamente afeta até 10% das crianças pequenas (principalmente meninos). o ‘distúrbio’ é caracterizado por fraco desempenho na escola e incapacidade de se concentrar nas aulas ou de ser controlado pelos pais. Supostamente é consequência de função cerebral defeituosa associada a outro neurotransmissor, a dopamina. O tratamento prescrito é um remédio análogo à anfetamina, chamado Ritalina. Há uma epidemia mundial crescente de uso da Ritalina. Dizem que as crianças não tratadas apresentam um risco maior de se tornarem criminosas, e há uma literatura em expansão sobre ‘a genética do comportamento criminoso e anti-social’. Será esta uma abordagem médico-psiquiátrica apropriada para um problema individual, ou um quebra-galho barato para evitar a necessidade de questionar a escola, os pais e o contexto social mais amplo da educação?” (pág.14)

“…não há dúvidas que a Ritalina ‘funciona’, como no testemunho de crianças entrevistadas (…). Entretanto, a Ritalina não ‘cura’ o TDAH mais que a aspirina cura a dor de dente. Mascarar a dor psíquica indicada pelo comportamento destrutivo pode propiciar um espaço para pais e professores respirarem e para a criança negociar um relacionamento novo e melhor; mas, se a oportunidade não for agarrada, mais uma vez vamos nos encontrar tentando ajustar a mente, em vez de ajustar a sociedade.” (p. 289).


escola e ritalina

Se você tivesse um filho diagnosticado com TDAH, qual resposta te agradaria mais?


a) Ele não é o campeão que o papai queria que ele fosse.
b) Ele está assim em decorrência de como ele foi criado (POR VOCÊ).
c) Ele está com problemas pessoais, está com outros pensamentos.
d) É biológico, fazer o quê né?


A verdade é que independentemente do que está correto, a quarta alternativa joga para debaixo do tapete as alternativas de cima. É muito mais fácil e agradável não se implicar no sofrimento psíquico de seu filho. “Mas peraí, ele que ta doido e a culpa é minha? Ah, qualé!”

O TDAH tornou-se o transtorno do momento justamente porque hoje tudo é dinâmico, tudo é possível, tudo é imediato. A frase que mais ouvimos e falamos é: “Cara, estou sem tempo” ou “Quando eu tiver um tempo eu vou fazer”. Vemos, então, pais que não possuem mais tempo para os filhos e filhos sem tempo para brincar, para fantasiar. Fantasia, esta, que deixou de pertencer à dimensão interna para ser exteriorizada em filmes e jogos. Saímos da dimensão ativa do pensamento para sermos agora pensados. Afinal, pensar e refletir estão fora de época. Este blog está fora de época, se você não olhou para este texto e desistiu porque está muito grande, considere-se diferente. Assim, uma criança que fantasia demais, é extremamente criativa, mas suas notas não são exemplares, é mal-vista na sociedade de hoje. E qual a solução para notas baixas?

Mas então você está falando que TDAH não existe? Claro que não! TDAH existe! Mas é a superfície, a ponta do iceberg, de diversos problemas relacionados. O recurso à Ritalina, que é um remédio TARJA PRETA, irá mascara-los.

Eu particularmente já tive a oportunidade de realizar uma avaliação que tinha como objetivo refutar ou confirmar um diagnóstico de TDAH. Em mais de 15 horas de análise pude observar que o adolescente apresentava sim todos os sintomas de TDAH, mas todos relacionados a um aspecto relacional (detalhes ocultados por questões éticas), onde a Ritalina não tinha nenhum efeito benéfico.

Parece que as pessoas se esqueceram que atenção não é algo que se diminui. Ela é direcionada para outro lugar, para outro pensamento, para qualquer coisa. Mas ninguem tem menos atenção que outra. Tem sim, menos capacidade de prestar atenção em um determinado objeto do que outra pessoa. Mas alguém já parou para pensar para onde foi essa atenção?

Como eu disse, hoje pensar gasta um tempo que as pessoas não tem. Eu mesmo to pensando aqui na tarde toda que eu gastei fazendo este post. Infelizmente hoje tudo é rápido e imediato né. É pá, pum. É tchu, tchá…

Ritalina e TDAH

Gregório De Sordi

Psicólogo, CRP 01/16979, mestre e doutor em Psicologia Clínica e Cultura pela Universidade de Brasília. Foi professor e coordenador do curso de psicologia da UNICEPLAC. É editor associado da revista "Psicologia: Teoria e Pesquisa" (Qualis A1). Tem experiência profissional na área de saúde mental, psicanálise, psicologia clínica e avaliação psicológica. Atende, com enfoque psicanalítico, adolescentes e adultos em consultório particular localizado em Brasília-DF e atendimentos virtuais. Telefone: (61) 999425123

1 Comentário

  1. A ritalina não é a solução, mas pode ajudar principalmente no estabelecimento de novas rotinas e, prioritariamente, em atividades acadêmicas.
    A tirinha que você usou ilustra bem isso.
    Pra quem não tem TDAH, pode ser difícil entender a dificuldade de sentar e fazer trabalhos ou parar pra estudar por meia hora que seja.. e a Ritalina torna isso milhares de vezes mais fácil pra quem é portador do transtorno.
    O problema é que quem ataca a ritalina quer coloca-la como desnecessária, ao invés de uma ferramenta auxiliar(junto com a terapia, reeducação alimentar, mudanças de hábitos, etc) no processo de reconstrução da vida(no caso de adultos), além de tornar a vida de crianças hiperativas mais controlável.

    Responder

Trackbacks/Pingbacks

  1. Alternativas de Publicidade Online ← Marketing Digital - [...] Li um artigo bacana hoje sobre o abuso da Ritalina. [...]

Enviar um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *