Psicanálise,Psicologia e Psiquiatria: como elas pensam?

Tenho ouvido muitas perguntas relacionadas à psicanálise versus psicologia versus psiquiatria.

Vi, ainda, que muitas pessoas definem o psicólogo como aquele que trata de pessoas “normais” e o psiquiatra de pessoas com “distúrbios mentais”. Isto é puramente um mito. Eles tratam do mesmo tipo de pacientes. Porém, pensam e tratam de forma diferente. Mas como?

Para entender melhor, recomendo uma leitura prévia do texto anterior sobre como você pensa antes de avançar.

Psicanálise, Psicologia e Psiquiatria: como elas pensam?

 

Vimos que há diferentes formas de pensar, de enxergar e apreender um fenômeno específico. Há ainda, várias definições do que é um fenômeno. Imagine, então, que diversas pessoas que compartilham de uma forma de pensar semelhante se encontram durante anos, formulando e produzindo conhecimento. Nasce aqui uma abordagem teórica.

Mas em outro lado do mundo, em uma cultura diferente, nasce outra abordagem e nesta, a forma de analisar tudo aquilo que a outra abordagem estava analisando é completamente diferente. Nascerá agora o debate teórico.

O ponto principal neste momento é saber que uma abordagem teórica nasce de uma cultura. Entenda que cultura é essa e você vai começar a compreender esta abordagem.

Para dar um exemplo concreto da influência da cultura, Psicanálise nos EUA virou Psicologia do Eu. É a “tradução” para a língua deles que os norte americanos fizeram da psicanálise. É a forma como eles enxergam a psicanálise e, portanto, não é a psicanálise em si. Se você está fazendo um trabalho de psicologia sobre psicanálise e está usando um autor norte americano falando dela, tome cuidado! O que ele está chamando de eu é o mesmo que o utilizado por Freud? É possível que não seja.

São justamente os pressupostos teóricos que temos que ter cuidado. A psiquiatria norte americana se intercala com a abordagem teórica cognitivo-comportamental justamente por ter uma semiologia, no mínimo, parecida. De forma semelhante, a psicanálise dialoga com a abordagem sistêmica e outras abordagens.

Entretanto, Psiquiatria e Psicanálise falam idiomas diferentes (a psiquiatria do Brasil, que é derivada da norte americana. Porque na França é comum os psiquiatras estudarem psicanálise).

E é uma pena que o Brasil derive sua semiologia de um País que fomenta a estereotipia. Ainda mais porque, em geral, a Saúde Mental nos EUA é péssima. Há poucas intervenções preventivas. Certa vez tive a oportunidade de ir a uma palestra de um jornalista do New York Times falando justamente sobre a dificuldade de encontrar tratamento para seu filho que não estava bem. Ele sempre ouvia: “mas ele é perigoso?”. Como era observado que não, seu filho não conseguia o tratamento.

É uma sociedade essencialmente capitalista e, assim, essencialmente pragmática. Até hoje estão procurando a pílula mágica para todos os problemas e fazendo pesquisas bizarras que buscam soluções concretas para problemas abstratos.

No fantástico passado, foi falado de umas pesquisas deste tipo: Homens que lavam a louça fazem menos sexo e homens que lavam louça são mais felizes. Conclusão: homens que fazem menos sexo são menos felizes?

Não, não, não! O que está errado é a forma de pensar, a própria semiologia e o objetivo da pesquisa. O que foi encontrado foi que em um determinado lugar e com um determinado número de pessoas esta correlação existe. Ou seja, uma analogia entre estas duas variáveis, mas não necessariamente uma causalidade. A partir da correlação, foi inferido que homens que não lavam louça fazem mais sexo. Temos de tomar muito cuidado com estas inferências, pois podem haver (e normalmente há) diversos fatores atuando para acontecer um determinado fenômeno.

Pesquisas deste tipo são ótimas para áreas como marketing, psicologia do trabalho, ciências políticas e para a maioria das áreas da medicina.

Agora, quando ela se encontra com o campo do psíquico, há de se reconhecer sua limitação. Justamente por causa do objeto de estudo ser de difícil objetivação. É um objeto subjetivo por natureza! A forma que uma pessoa sofre, sente, experiência e vive é diferente da forma de outra pessoa. E ainda, como se pode objetivar sem prejuízo um sentimento tão abstrato como a angústia?

Dessa forma, motivado pelo sofrimento humano, o campo de estudo exigiu o nascimento de diferentes abordagens teóricas na psicologia.

A histeria, que é onde nasceu a psicanálise, é o terror da psiquiatria norte-americana. Exatamente porque necessita um estudo subjetivo e é de difícil de ser objetivada. Nasce aí os Transtorno de Personalidade Histriônica, transtorno dissociativo ou conversivo, mas que nada mais são do que constatações dos sintomas, ignorando o que está escamoteado por trás deles. Ou seja, desprivilegia a causa, ou as causas de origem psicológica.

Recorre-se, então, a uma explicação biológica. O famoso jargão “só pode ser genético” prevalece, uma vez que as outras possibilidades causais só poderiam ser acessadas por outra semiologia.

Por fim, é neste ponto que crescem os questionamentos. Psicose é genético? E é para sempre? Será? Os borderlines ou estados limites estão aí justamente para nos fazer questionar estas afirmações. O que é mesmo que você entende por psicose?

A partir de agora, antes de comprar uma ideia,

questione!

Gregório De Sordi

Psicólogo, CRP 01/16979, mestre e doutor em Psicologia Clínica e Cultura pela Universidade de Brasília. Foi professor e coordenador do curso de psicologia da UNICEPLAC. É editor associado da revista "Psicologia: Teoria e Pesquisa" (Qualis A1). Tem experiência profissional na área de saúde mental, psicanálise, psicologia clínica e avaliação psicológica. Atende, com enfoque psicanalítico, adolescentes e adultos em consultório particular localizado em Brasília-DF e atendimentos virtuais. Telefone: (61) 999425123

3 Comentários

  1. Parabéns Gregorio.

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  2. O psicólogo pode receitar remédio antidepressivo?

    Responder
    • Não jé. Nem o psicólogo, nem o psicanalista podem receitar remédios. Somente o psiquiatra que pode.

      Responder

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