A honra, a vaidade e a imagem social

“O que fazemos na vida, ecoa na eternidade” Gladiador.

Qual foi a primeira coisa que veio na sua cabeça ao ler honra no título? Um guerreiro defendendo o seu país? A honra da família?

Honra é uma virtude ou uma qualidade admirável pertencente a alguém. No Japão Feudal, a honra era a qualidade dos samurais, os quais eram guerreiros a serviço do Shogun. Existia até um código de honra que fundamentava suas ações. Para um samurai, a vida é limitada, mas o nome e a honra podem durar para sempre.

Podemos ver no vídeo acima do filme 300 a seguinte frase, “Você aí, Ephialtes, que você viva para sempre”.

Pode parecer bizarro para alguns, que viver para sempre, neste caso, seja uma maldição. Mas aí que reside à beleza da honra. De que adianta viver para sempre, se será uma vida vazia e sem importância?

Algumas religiões tocam neste assunto quando falam sobre o juízo final, as punições pós-morte. A diferença é que na honra não é necessário punição. Esta advém naturalmente pelo vazio, pela insuficiência, pelo tédio, pelo remorso e pelo sofrimento abstrato proveniente de não ter nada virtuosamente significativo.

Por isso o código de honra dos Samurais não era escrito. Pois a honra deveria ser vivida e sentida.

Honra é, portanto, sinônimo de digno e honesto e tem como principal antônimo a covardia. É expressada no cumprimento da palavra, da promessa e em cada ato sincero. É quando se promete algo e não é preciso contrato, assinatura ou gravação, porque será feito. É quando uma mãe se desdobra para cuidar de um filho. É quando uma pessoa arrisca sua vida em prol de uma causa maior, como salvar uma pessoa que está morrendo, um país da corrupção ou da tirania de um ditador.

A honra representa a existência de algo que é maior do que você.

 

Honra

Ele só queria morrer logo para ficar com sua esposa e filho e acabar com seu sofrimento. Mas antes tinha que salvar Roma de um imperador assassino.

Infelizmente, aos poucos a honra foi corrompida pela vaidade. A imagem pública tornou-se aos poucos mais importante que ela e a honra se transformou em um novo conceito: a integridade moral, ou ainda melhor, a imagem social.

Ou seja, este novo conceito de honra deixa de ser uma forma de ser, para ser uma forma de se mostrar. Quando se fala que a filha destruiu a honra da família, na verdade se está falando que a filha destruiu a vaidade que seus pais se esforçam para sustentar.

No caso dos samurais e ainda de certa forma na cultura oriental, isso gerava/gera suicídios motivados pela culpa de ter quebrado a “honra” da família. Honra passou a ser muito mais a forma da família ou da pessoa de se apresentar em público.

Por exemplo, no Brasil temos em nosso código penal os crimes contra a honra (http://pt.wikipedia.org/wiki/Crimes_contra_a_honra), que tipicamente são a calúnia, a difamação e a injúria. Ou seja, crimes contra a imagem social, mas não contra a honra em seu conceito “antigo”.

A honra virtuosa (vou começar a chamar assim o conceito antigo) não pode ser difamada por ninguém senão você mesmo. É algo que está ligado ao âmbito social, mas que reside no âmbito individual.

Portanto, o conceito de honra foi corrompido para dar lugar a outro que busca sustentar o próprio narcisismo. É exatamente o contrário da honra virtuosa que reconhece uma alteridade de algo maior.

Pois é, acredito que hoje, em uma sociedade que valoriza e incentiva qualidades narcísicas, a honra virtuosa está cada vez mais rara de se ver. Ainda mais porque ela exigiria diversas renúncias que muitas vezes não estamos dispostos a fazer. Na verdade, a vejo como um conceito idealizado, que mesmo distante e em conflito com elementos da natureza humana e da sociedade atual, é louvável quando serve como guia e se presentifica em algum ato.

“O caminho mais grandioso para viver com honra neste mundo é ser a pessoa que fingimos ser”. Sócrates

Gregório De Sordi

Psicólogo, CRP 01/16979, mestre e doutor em Psicologia Clínica e Cultura pela Universidade de Brasília. Foi professor e coordenador do curso de psicologia da UNICEPLAC. É editor associado da revista "Psicologia: Teoria e Pesquisa" (Qualis A1). Tem experiência profissional na área de saúde mental, psicanálise, psicologia clínica e avaliação psicológica. Atende, com enfoque psicanalítico, adolescentes e adultos em consultório particular localizado em Brasília-DF e atendimentos virtuais. Telefone: (61) 999425123

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